Reportagem: Elena Wesley
Arte: Nícolas Noel
Quantas exposições você visitou esse ano? Quantas delas ficavam no bairro ou na favela onde você mora? Provavelmente, a quantidade caiu da primeira pra segunda pergunta, né?! No Rio de Janeiro, os espaços de arte, sobretudo os de arte visual, estão localizados nos grandes centros e nos bairros de maior poder aquisitivo, o que exige da população mais pobre um deslocamento pela cidade e, consequentemente, um distanciamento desse grupo a este tipo de cultura.
Segundo dados do Data.Rio referentes a 2008, 82% dos equipamentos culturais do município estão concentrados no Centro e na Zona Sul, entre museus, bibliotecas, escolas de música, centros culturais, galerias de arte e salas de espetáculos.
É nesse cenário que jovens moradores de favelas e periferias têm criado iniciativas e espaços de arte nos subúrbios. É o caso da exposição Suburbanidades – O Lugar da Periferia na Arte Contemporânea, idealizada pela produtora cultural e grafiteira Cynthia Aith. Cria da Baixada e sempre transitando pela Zona Norte, a professora de Artes foi fazer faculdade no interior do estado e, ao retornar, sentiu a dificuldade de se inserir na cena artística carioca.
“É uma cena muito elitizada, então eu concluí que precisava falar sobre essas questões de território”, conta. A artista começou a abordar o tema na obra “Voa, Bicho”, em 2016, que culminou na “Suburbanidades”. O evento, que já teve seis edições, abre chamada aberta para que outros artistas periféricos possam expor seus trabalhos.
Na favela 5 bocas, no bairro Brás de Pina, na zona norte, Allan Weber, de 29 anos, mantém uma galeria que leva o nome da comunidade. O projeto busca aproximar a população favelada da arte visual a partir do uso do repertório das pessoas da região. É com os códigos da favela, as referências às facções e vários elementos da cultura carioca que ele tem proporcionado uma identificação entre o público e as obras.
Além de ampliar o consumo dos moradores do bairro, o jovem de 29 anos tem conseguido abrir espaço para outros artistas como ele. Tudo isso com recursos que ele mesmo corre atrás, seja pelas obras vendidas ou pelas entregas que faz como motoboy.
De olho em iniciativas como essas, o curador e gestor cultural, Alexandre Silva, desenvolveu o projeto Outrxs Centrxs, com a proposta de mapear quem tem construído a cena das artes visuais nas fora do circuito tradicional.
“Talvez por falta de mapeamento e sistematização desses projetos, temos ainda dificuldade de enxergar essa cena como um circuito. Então a ideia é podermos oferecer um panorama, mesmo que incompleto, do recorte da cena das artes visuais em espaços periféricos no Rio e, assim, redesenhar o mapa das artes no Rio, promovendo outras centralidades e trajetos culturais”, explica.
Alexandre acrescenta que ter dados sobre estes projetos é importante para que os setores que investem na cultura também os considerem. “Isso é importante não apenas para as comunidades reconhecerem esses projetos, mas também para o fortalecimento dessa rede que está no contrafluxo dos espaços e instituições que historicamente têm recebido mais investimentos, seja de políticas públicas culturais ou do setor privado”.
O Guia da Arte Periférica elaborado por Alexandre abrange mais de 20 iniciativass de artes visuais, incluindo a Galeria 5 Bocas, e traz informações básicas para visitação. Você pode conferir mais informações sobre os espaços mapeados pelo Outrxs Centrx aqui.