FISCALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE ÁGUA E SANEAMENTO

População se mobiliza pelo funcionamento dos comitês de monitoramento das concessionárias

“Em até 6 (seis) meses após a celebração dos CONTRATOS, o ESTADO convocará os titulares dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário e a sociedade civil a constituir o COMITÊ DE MONITORAMENTO”. Esta ação estava prevista num edital publicado pelo governo do estado em agosto de 2022. Contudo, mais de um ano depois, a população ainda tenta oficializar este espaço de fiscalização e participação social, com o objetivo de garantir o acesso ao abastecimento de água e à coleta e tratamento de esgoto para todas as pessoas. Após longa articulação, entidades da sociedade civil conseguiram eleger representantes e aguardam a publicação do regimento interno para iniciar oficialmente os trabalhos. 

A criação dos comitês de monitoramento das concessionárias de saneamento era um dos critérios estabelecidos na concessão dos serviços da  Companhia Estadual de Água e Esgoto (Cedae), que permitiu que empresas privadas comercializassem estes serviços em bairros da capital e municípios do estado do Rio de Janeiro. Formados por representantes do governo do estado, do Ministério Público, da sociedade civil e dos usuários do serviço, os comitês teriam como função participar da formulação de políticas, de planejamento e de avaliação dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário. Assim, qualquer cidadão poderia procurar os integrantes do comitê responsável pela área onde mora para levar reclamações e sugestões.

Problemas sobre saneamento os moradores da Maré conhecem de perto no dia a dia. Em dezembro de 2022, Parque União, Rubens Vaz, Nova Holanda e Morro do Timbau enfrentaram uma crise hídrica: cerca de 20 dias sem abastecimento, seguidos pelo fornecimento de  uma água marrom, com odor ruim, nitidamente imprópria para consumo. Em relação ao esgoto, o cenário não é melhor. Mais da metade das queixas de moradores coletadas pelo Cocozap, projeto de monitoramento de saneamento básico do data_labe, se referem a problemas com esgoto.

Ativistas ampliaram participação popular nos comitês

O educador Bruno França, que participa da pressão da sociedade civil pelos comitês, explica que a negociação para a concessão dos serviços da Cedae foi pouco democrática desde o início, com diversos obstáculos do governo à participação popular.

“[O processo] aconteceu pouco antes da pandemia e se fortaleceu durante a pandemia, com pouquíssimos espaços de representação social, de questionamento. A participação nas audiências online foi baixa e havia muita restrição para o tempo de fala dos participantes”, conta o representante da FASE Rio, que integra o comitê do bloco 4 como representante da sociedade civil. 

Embora o Estado não tenha priorizado assegurar o funcionamento deste espaço, a sociedade civil tomou as rédeas da situação. A Rede Popular de Vigilância e Saneamento e Saúde tem sido uma das protagonistas do processo. Constituído em 2022 a partir de um projeto abrigado na Fiocruz, o grupo reúne mais de 60 instituições em defesa do acesso à água e ao saneamento. Ao longo de 20 audiências, os ativistas conseguiram assumir a presidência de três dos quatro comitês, reduzir o poder de decisão de membros das prefeituras (parte interessada no processo da concessão) e questionar a ocupação de vagas destinadas à sociedade civil por representantes das empresas. 

A ativação dos comitês ainda depende da publicação do regime interno no Diário Oficial do governo e da oferta da estrutura necessária pelo governo do estado e pela Agência Reguladora de Energia e Saneamento Básico do Estado do Rio de Janeiro – Agenersa. A expectativa é que os espaços comecem a funcionar ainda este ano. Moradores das áreas atendidas pelas concessionárias poderão participar dos comitês a partir dos representantes da sociedade civil, que abrange universidades, órgãos ligados ao direito ao consumidor e a própria Rede Popular de Vigilância em Saneamento e Saúde.

Em dezembro de 2022, moradores de favelas da Maré ficaram 20 dias sem água. Quando chegou, a água veio suja e imprópria para o consumo. (Foto: Acervo Cocôzap)

Comitês defenderão o acesso à tarifa social e mais transparência por parte das concessionárias

Para Bruno, a efetivação dos comitês de monitoramento fortalece uma instância que seria instituída apenas para cumprir o contrato. 

“Essa articulação trouxe expectativa de que os comitês funcionem realmente em defesa do interesse público, pela ampliação dos direitos relacionados à água e ao saneamento, como uma nova legislação para a tarifa social, a ação civil pública pelo mínimo vital de água e a inclusão do atendimento da população das favelas que não consta nos contratos”, avalia Bruno. 

Os comitês vão acompanhar de perto estas pautas urgentes sobre o saneamento, citadas por Bruno. Tramita na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) o projeto de lei 5684/2022, que institui critérios para a aplicação da tarifa social. Atualmente o benefício está regulamentado pelo Decreto 2538/1999, que determina o direito de acesso à tarifa social às pessoas que moram em áreas de interesse social, como é o caso das favelas e dos conjuntos habitacionais. Contudo, o benefício não é automático e nem sempre quem solicita junto às concessionárias consegue aprovação. 

Outra bandeira relevante no estado é a garantia do volume mínimo vital de água, isto é, uma quantidade mínima de água a quem não pode pagar nem mesmo a tarifa social. O tema é pleiteado na Justiça por meio de uma ação civil pública encaminhada pela Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro.

Saiba mais sobre a tarifa social e o mínimo vital de água nas matérias abaixo:

Você pode conferir qual a concessionária responsável pelo seu bairro neste link.

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