ÁGUA IMPRÓPRIA PARA CONSUMO

Mais de 80% dos moradores do Complexo do Lins já sofreram com o serviço de abastecimento de água, segundo pesquisa da Fiocruz

Texto: Redação data_labe
Artes: Nicolas Noel

Água com odor, cor e gosto ruim. Esta é a realidade de 81,94% dos moradores do Complexo do Lins, na zona norte do Rio de Janeiro, que responderam a um questionário sobre acesso ao saneamento básico. A pesquisa faz parte do projeto “Vigilância Popular em Saneamento e Saúde”, uma iniciativa da Fiocruz em parceria com organizações da sociedade civil que pretende mapear os problemas com saneamento de áreas identificadas como vulneráveis em relação a questões sociais e ambientais no Estado do Rio de Janeiro e implementar tecnologias sociais de tratamento de água e de esgoto. 

Mais de 70 moradores participaram da pesquisa durante oficinas de educação ambiental realizadas pelo projeto em 2023. O diagnóstico da Bacia Hidrográfica do Canal da Cunha revela que 56,94% dos respondentes tiveram o abastecimento de água interrompido desde que a concessionária Águas do Rio assumiu o serviço em novembro de 2021. Sem a oferta regular, os moradores costumam recorrer a fontes alternativas de água para garantir sua higiene e consumo.

Cerca de 45% das pessoas que participaram da pesquisa convivem com valas de esgoto próximo às suas residências. Foto: Acervo Rede de Vigilância Popular em Saneamento

Esgoto e lixo também são motivo de dor de cabeça para moradores do Lins

Quase metade das pessoas que participaram da pesquisa (45,83%) afirmam conviver com valas de esgoto próximo às suas residências. 

Morador do bairro, Rafael dos Santos Sousa, de 37 anos, conta que a população da região tira dinheiro do próprio bolso para driblar os problemas com o saneamento básico.

Quando falta água é por muito tempo, então os moradores são obrigados a descer até a adutora para buscar água. Em relação ao esgoto geralmente a gente vai se virando, criando rede própria de abastecimento ou de esgotamento e com os nossos próprios recursos”, relata o analista de responsabilidade social, que integra o coletivo local Voz do Lins, um dos parceiros da Fiocruz no projeto.

Moradores contam na pesquisa que, devido à coleta irregular, barrancos são frequentemente usados para descarte de lixo. Foto: Acervo Rede de Vigilância Popular em Saneamento

Outro problema apontado pela pesquisa é a irregularidade na coleta de lixo. Quase 40% dos respondentes afirmam ser comum que a região fique sem o serviço por longos períodos. Não à toa os dados também indicam que metade dos participantes conta que os barrancos da localidade são usados como depósito de lixo. 

Além dos riscos de proliferação de animais que podem provocar zoonoses, parte dos moradores (55,56%) também acredita que o acúmulo de lixo pode contaminar as nascentes da localidade, que são usadas inclusive como fontes alternativas de consumo de água.

Assim como o Lins, o Complexo do Alemão, na zona norte, o bairro de Bangu, na zona oeste da capital, e os municípios de Japeri e Mesquita, na Baixada Fluminense, também têm participado do diagnóstico. À frente do projeto, a pesquisadora em Saúde Pública da Fiocruz, Doutora Adriana Sotero Martins, explica que os questionários aplicados junto aos moradores consideram as especificidades de cada localidade.

Os dados vão mostrar um recorte da situação da população e, por isso, é tão importante construir o projeto junto às associações de moradores e às ONGs que atuam nos territórios, como a Voz do Lins”, ressalta Adriana.

Projeto prevê implementação de tecnologias sociais de tratamento de esgoto e de água

Após os diagnósticos, algumas das localidades receberão a segunda etapa do projeto, que é a implementação de duas tecnologias sociais: a bacia de evapotranspiração, que trata o esgoto sanitário, e o filtro biológico, que permite captar água das nascentes e torná-la apropriada para consumo e higiene pessoal e da casa.

“Um dos objetivos centrais do projeto é preservar as nascentes dos rios da Serra dos Pretos Forros, na região de Água Santa e Lins de Vasconcelos, pois eles drenam para a Bacia do Canal do Cunha. São ações que vão melhorar a vida dos moradores e, consequentemente, contribuir para o plano de redução da degradação da Baía de Guanabara”, acrescenta.

Os dados serão sistematizados e disponibilizados à sociedade civil e utilizados para articulação junto às concessionárias e aos órgãos públicos responsáveis a partir da atuação da Rede Popular de Vigilância em Saneamento, que reúne diversas organizações em defesa de direitos, como a FASE, o data_labe, o Canal Saúde e a própria Fiocruz.

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